Apesar de Four
Quartets serem quatro poemas longos, decidimos escrever duas cartas. Esta
escolha deveu-se quer a um formato diferente, ou seja algo que não fosse um
poema, quer à circunstância de num outro seminário (Estudos Inter-Artes) que estamos
a ter. Pareceu-nos às duas que escrever uma carta cada era algo que podia
dar-nos uma perspectiva diferente tanto do poema como da interpretação que cada
uma faz dele.
Apesar de ser um trabalho em grupo fizemos as
nossas cartas em separado. Curiosamente partilhamos um hábito: quando lemos,
temos sempre um lápis à mão para tirar notas ou sublinhar frases ou mesmo
vários versos que gostamos. A partir daí, cada uma começou a compor a sua carta
com frases que sublinho dos quatro poemas. A ideia era cada uma dar o seu
sentido a essas frases mas não seguimos a ordem em que elas aparecem nos
poemas, pelo menos isso não era obrigatório.
Claro
que isto resultou em duas cartas muito diferentes, até com destinatários
distintos. Ao início, pensámos que as cartas podiam ser uma correspondência uma
da outra mas ao ler as respetivas cartas, decidimos deixá-las como estavam:
dois elementos separados, com ideias gerais diferentes mas com três frases em
comum: “streets I never thought I should revisit”, “as we grow older the world
becomes stranger” e “there is no end, but addition”. O primeiro verso pertence ao poema Little Gidding que é um poema dominado pela presença da guerra e pelo sentimento de estar entre dois mundos. As cartas introduzem a questão de um mundo espiritual, que T. S. Eliot trabalha nos seus poemas, mundo este que pode estabelecer uma ligação à vida do dia-a-dia, uma vez que o sujeito poético consegue ligar-se a essa espiritualidade, que parece estar associada a memórias passadas, mesmo que o seu corpo físico não o acompanhe nessa ligação.
O segundo verso, presente em East Coker, continua, de certa forma, nesta linha de ideias, uma vez que reflecte sobre a incapacidade do sujeito poético encontrar a nível espiritual um local em que se sinta em casa. Além disso em East Coker, o sujeito poético volta novamente a insistir na temática do tempo (presente em todos os poemas de uma forma ou outra) mas distingue-se por remeter para a infância. Este verso constrói uma sensação de melancolia da infância, porque quando se cresce apercebemo-nos de que não conhecemos o mundo assim tão bem, o que sublinha a noção de passagem de tempo muito presente nos poemas e as dificuldades que lhe são associadas.
O último verso, retirado de Dry Salvages, tem uma carga negativa que continua associada a essa fluidez e passagem do tempo e das consequências que isso traz consigo, como se não houvesse a possibilidade de haver um fim para esses obstáculos.
A humildade é um tema específico presente em Four Quartets, vista como a maneira de enfrentar a dor da existência humana, porque é o nosso ego que nos faz preocupar com a vida e com a morte. Na carta dirigida ao “Maestro” essa ideia mantém-se de forma explícita, porém na carta dirigida aos “voyagers” está apenas implícita, uma vez que transmite somente a preocupação humana centrada no “eu”.
Outra noção interessante nos poemas de Eliot é a relação entre o Homem e a natureza e como as acções do Homem não interrompem o percurso da natureza. As nossas cartas correspondem bastante com a primeira parte da temática, ou seja, a ligação entre o ser humano e vários elementos da natureza, como a água em movimento ou as pétalas de uma flor a murchar. As acções do Homem têm grande semelhança com as natureza, também em nós há constante movimento, também em nós se sente a passagem do tempo.
O tempo não é visto como uma linha recta, todo o tempo parece estar contido num só, porque nos ligamos ao passado e ao futuro. No entanto, as nossas cartas captam marioritariamente a relação com o passado e como este é alcançado através da memória, é o passado que molda os remetentes, existindo apenas pequenas indicações em relação ao futuro.
Porém, nas nossas cartas não só recuperamos algumas temáticas como damos a volta ao significado primário destes versos. O tema do Tempo continua presente nas duas cartas, assim como a noção de se estar entre dois Mundos (o que abre muitas possibilidades). Para nós não haver fim tem carga positiva e a ideia de adição está para lá das coisas negativas, é como se o fim não fosse necessariamente o momento final mas talvez o começo de algo diferente. É, de facto, interessante ver como partilhámos esta necessidade de introduzir temáticas semelhantes nas nossas cartas e de como tentámos modificar perspectivas mais negativas do original em visões optimistas. Ou seja, trabalhámos de duas maneiras esta manipulação do poema: fizemos um exercício de corta e cola em que alteramos bastante os sentidos para que aponta o poema, mas também fomos capazes de adoptar algumas das suas perspectivas.
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