pai Nosso,
onde quer que estejas, santificado seja o Nosso nome,
seja feita
a Nossa vontade na terra, que quem está no céu já não quer saber.
começa
assim a nova boa nova, o evangelho segundo os melhores e os piores da minha
geração, e os que não têm geração, e
quem mais se quiser juntar,
LAUDEM,
LATEM, LUTEM!
nasceram
os Cristos,
filhos da
Porteira a quem foi fechada a porta, lá a limpa ainda para quem lha
fechou,
da
Doméstica que cozinha sem ter que comer, dobrada na sua fome, esquece a
angústia que tem,
da
Reformada que escolhe entre a renda e a farmácia, só se descobre o corpo
morto quando o senhorio reclama a
renda,
da
Desempregada a quem dizem que andou a viver acima das suas possibilidades,
quando do que ela tem medo é de viver
debaixo da ponte,
da
Mendiga, de lata na mão, que dorme ali no S. Jorge mas teima em não ir ao
cinema,
há de sempre haver quem tenha má
vontade,
da
Revolucionária, que de punho erguido grita LIBERDADE, a do povo que é
oprimido, e a dela que é levada pelos
braços comprados da justiça cega,
da Puta
que se vende porque tem de ser e da que quer ser, sendo Puta.
mas onde
está a virgem?
essa maria
pura casta irreal,
não anda
de certeza pelas ruas desoladas iguais a quem por elas anda, onde o grito do
vagabundo se confunde com o latido do
seu fiel companheiro,
pelos
mercados a tentar fazer o melhor negócio para alimentar a pobreza,
leviatã de boca escancarada a engordar
da barriga vazia,
pelos autocarros
às sete da manhã a lutar por um lugar, os únicos quinze minutos em que
pode fechar os olhos e esquecer o filho
que não conseguiu tomar o pequeno-almoço,
pelas
tascas a ouvir o fado vadio enquanto bebe uma água ardente, para aquecer o corpo
e a
alma.
a virgem,
essa tem um trabalho das nove às cinco, secretária de mogno,
aquecimento central, salada pré-feita
para o almoço, buscar os miúdos às seis,
jantar, passear o cão, tão bem
comportado, nem late, vejam só,
telenovela, chichi e caminha.
anunciem
os Cristos, a nova raça de homens e mulheres e trans e bichas e quem não quer
ser nada,
raça
mundana e da terra, como se quer,
a suar
sobre os fornos de uma qualquer cadeia de fast-food, sem perspectivas de
futuro que não seja o de não quebrar
sob o peso da inutilidade, não a deles,
mas da vida,
ou então,
Bom dia, quer aderir ao novo pacote, repetido, repetido, repetido, repetido,
repetido, repetido, decadência em
cadência,
Bom dia, estamos a fazer uma oferta
especial, desliga e volta a ligar,
a levar
todos os dias com a santíssima trindade, pai, filho & empreendedorismo Lda,
o falso profeta, que já não precisa vir
vestido com pele de ovelha,
andar de lobo está na moda,
Ao menos tens emprego, diz o
ilustríssimo empreendedor
O problema é que as pessoas não querem
trabalhar, queixa-se o
sapientíssimo economista,
Queremos alguém com completa e total
disponibilidade para trabalhar a qualquer hora
sem nenhuma remuneração, oferece
generosamente o empregador,
já nem para os mandar foder há forças,
rafeiros
treinados para o abate,
seres
criados para a destruição,
carvão
numa fornalha que nunca se extingue,
com Eles
arde o mundo, Eles são o mundo,
o problema
é que o mundo arde mas o fósforo não se queima.
cão que
ladra tem que aprender a morder a mão que finge que o alimenta,
lamber-lhe os dedos não faz nada.
pelos
Cristos, com os Cristos, nos Cristos,
agora e
para sempre,
Amen.